A MORTE DE JOÃO PESSOA
A MORTE DE JOÃO
PESSOA
Barbosa Lima Sobrinho
Desde o Recife, as manifestações
provocadas pela morte de João Pessoa tomaram feição
fantástica de luta, de revolta, de pesar. E seria apenas
o início de uma série de demonstrações
como o Brasil dificilmente verá iguais.
Na Paraíba, ao ter
notícia do crime, a multidão ia para as ruas, expandindo-se
em depredações contra os adversários. Perto
de duzentos presos saíam da cadeia pública, e reunindo-se
à turba enfurecida, caíam sobre as propriedades
dos inimigos políticos, para destruí-las, para reduzi-las
à cinzas. De toda a parte, ouviam-se tiros, deflagração
de bombas de dinamite. As labaredas dos incêndios ateados
pelo povo dentro em pouco subiam na treva da noite, como se outra
pira não parecesse digna do morto que todos choravam. O
governo nada podia fazer. A maior parte da polícia estava
no sertão, na luta contra José Pereira; o exército
não saía dos quartéis, para não irritar
ainda mais, as expansões dessa noite trágica. Os
próprios bombeiros não acudiam aos incêndios,
pois que a multidão lhes estragara os aparelhos no desejo
de evitar que pudessem atalhar a obra vingadora das chamas.
Imaginemos uma cidade, em
que todos os habitantes houvessem perdido, no mesmo dia e na mesma
hora, o parente mais querido e mais amigo. Reunamos todas essas
almas augustiadas numa procissão colossal. Os oradores
trocam as palavras por soluços, que se comunicam aos ouvintes
e juntam-se no soluço enorme de toda a cidade; os músicos
não conseguem tirar dos pulmões o sopro necessário
aos instrumentos, tanto é a comoção que lhes
aperta a garganta.
Quando o navio desamarrou
de Cabedelo, trazendo para o Rio o corpo do Presidente assassinado,
a multidão imensa, acumulada no cais, alucinada pela dor
de quem sente partir-se o coração, exclamava, numa
voz que o desespero tornava soturna :
- ADEUS, ADEUS, ADEUS, JOÃO
PESSOA !
Daí por diante, de
Cabedelo ao Rio, as manifestações repetem-se, num
tom pouco menos dramático do que na Paraíba ou no
Recife. Na Capital da República, sob os olhos do governo
do país, o cortejo que se formou foi dos maiores que já
desfilaram em tais circunstâncias. Nenhuma caravana política
de tantas que percorreram o Brasil na propaganda das candidaturas
aliancistas, pôde fazer pela causa o que esse cortejo fúnebre
vai conseguindo.
Na Câmara dos Deputados,
abrindo o debate a propósito do assassinato de João
Pessoa, o líder gaúcho, sr. Lindolfo Color, no termo
de um libelo contra o sr. Washington Luiz, fazia vibrar no recinto
uma imprecaução acusadora: "Caim, que fizeste
de teu irmão? Presidente da República, que fizeste
do Presidente da Paraíba?"
A exaltação
de ânimos permitia o exagero, que, concordava perfeitamente,
com as exigências dessa hora dramática.